Advogados

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

A perda

Perder é verbo que corria-lhe nas veias. Desde a infância foi assim, acostumado a não vencer, malograr-se, deixar fugir – desditas que se entranharam com tal força que não causavam mais dor ou desaponto. Era um estado normal, por assim dizer.

Na adolescência, teve supresso o juízo; na juventude, as oportunidades; na vida adulta, deixou de se respeitar.

A ruína moral veio na esteira. Perdeu a inocência, a razão, os pais, a alegria, a mulher, os filhos, o emprego, o amor-próprio, os cabelos, os dentes. Por fim, perdeu a vida. E, então, ganhou.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Panacéias

Em pesquisas cotidianas nos antigos exemplares do jornal Comércio do Jahu, deparo com inusitada publicidade, publicada em julho de 1941, do Elixir 914, panacéia recomendada para reumatismo, sífilis e outros.

O texto:

Tenha Juízo

Grande crime casar doente.
Grande número de homens casados que em solteiros adquiriram doenças secretas, ficaram com elas crônicas, eis a razão porque milhares de senhoras sofrem sem saber a que atribuir a causa desses casos. Para recuperar a saúde bastam alguns vidros de Elixir 914

Havia também, naqueles idos, as Pilulas do Abbade Moss, eficacíssimas para prisão de ventre, fígado, mau hálito, palpitações, gases, peso no estômago, gênio irascível e calor na cabeça.

Entrega do Troféu Juca Pato

No próximo dia 30 de novembro, às 18h, no Salão Nobre da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Largo de São Francisco, nº 95, se realizará solenidade de entrega do troféu Juca Pato à escritora Lygia Fagundes Telles, eleita Intelectual do Ano de 2008, em concurso promovido pela União Brasileira de Escritores. Após a cerimônia será servido coquetel na Sala São Leopoldo.

Frase

"Onde não há saia, não há ordem!"

Eça de Queirós

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Academia Paulista de Letras comemora 100 anos

Nesta quinta-feira, dia 26 de novembro, às 18h30, a Academia Paulista de Letras comemora 100 anos, no Teatro do CIEE. Durante todo o ano de 2009 a entidade recebeu homenagens de diversas personalidades e associações, além de ter lançado o livro do centenário de autoria do presidente da Academia, José Renato Nalini, e do fotógrafo Marcio Scavone.

O evento desta quinta-feira terá início com o hino nacional brasileiro, pelo Coral Madrigal Sempre En Canto, com regência da maestrina Regina Kinjo.

Em seguida, pronunciamentos de Ruy Martins Altenfelder Silva, presidente da Academia Paulista de Letras Jurídicas e do Conselho de Administração do CIEE; Cícero Sandroni, presidente da Academia Brasileira de Letras; Luiz Gonzaga Bertelli, presidente da Academia Paulista de História e presidente executivo do CIEE; José Renato Nalini, presidente da Academia Paulista de Letras; Paulo Bomfim, decano da Academia Paulista de Letras. Por fim, haverá apresentação de concerto musical, regido pelo maestro João Carlos Martins. Após o evento, será oferecido coquetel de confraternização no Foyer do Espaço Sociocultural, no teatro CIEE.

Informações:
O Teatro CIEE fica na Rua Tabapuã, 445 – Itaim Bibi – São Paulo.
As inscrições podem ser feitas gratuitamente pelos telefones (11) 3040-6541 / 3040-6542

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

A mulher

A mulher fez a passagem e sequer havia se dado conta. As últimas lembranças eram as das recusas em série, sequências infindas de nãos e as portas a baterem-lhe a cara.

Vendia cosméticos em domicílio, trabalho que lhe rendeu uma coleção enorme de amizades e bons tostões no decurso dos anos. Houve, então, que as donas-de-casa, aquelas mulheres gentis sempre prontas a recebê-la e tomar informações sobre os rouges, os pós-de-arroz, batons e esmaltes, foram desaparecendo como por encanto.

Ultimamente, em suas manhãs e tardes, deparava com casas vazias. Agastava os dedos nas campainhas, mas as moradoras não mais atendiam. Onde foram parar? Não raro, a porta era aberta por um homem, que tratava de dispensá-la de pronto, sob a alegação de que sua mulher não estava. Estranhou, mas persistiu até quanto foi possível. Em um final de tarde, num dia que retornava a casa sem ter vendido ao menos um vidro de esmalte, sentiu-se abater por um desalento incomensurável. Foi quando tudo se deu.
A vista se anuviou, as pernas bambearam e o resto foi negrume. Fez a passagem. Não, não foi o desencarne. Atravessou o portal para onde vão os desestimados, os esquecidos, os deslocados, as gentes que perderam as funções. Uma existência paralela, que há aqui, a meu lado, ao seu, sem ocupar o mesmo espaço, mas que a maioria não se dá conta. Por falta de interesse. Ou de tempo. Ou os dois.

A mulher deparou com outras pessoas, uns atônitos tais como ela; outros tantos repetiam gestuais ou executavam trabalhos, aos quais se entregavam quando viviam do outro lado. Estavam lá os braçais que limpavam as ervas das frinchas dos paralelepípedos, os carroceiros que entregavam pão, leite e miúdos de frango, os vendedores de enciclopédias, amoladores de facas e tesouras, ferradores, seleiros, beijueiros, gentes às quais o mundo moderno pôs de lado, sem piedade.

À sua frente, do nada, brotou um engraxate. A seu lado, surgiu um vendedor de raspadinha. Mais adiante, o homem do algodão doce, o sapateiro, a quituteira. A mulher passou a se dar conta de que não avistava mais esses trabalhadores em seu cotidiano de há tempos.

De primeiro, chorou. Tantos haviam desaparecido, sem que sentisse falta, até que ela mesma viesse engrossar a lista. Sentiu saudades de um mundo que deixara de ser. Quanta cegueira, lamentava. Como não se apercebera que ninguém mais lhe tentava persuadir, à porta, a comprar a Barsa, a coleção de Monteiro Lobato? O que foi feito de tudo?

Secou as lágrimas e seguiu, entre os desencontrados, a oferecer de longe em longe seus batons.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

A verdade sobre o apagão

Circula na rede uma explicação mais convincente que as falas vazias da Dilma para o apagão

Diz que a engenheira estagiária, loira, ficou até mais tarde em Itaipu, colocando o serviço em dia ... e .... antes de sair .... apagou tudo ... simples assim ....

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Apagão


Fatores atmosféricos e condições metereológicas adversas culminaram no desligamento de todas as turbinas do meu cérebro e provocaram um apagão sem precedentes em minha realidade. Cessaram-me as vontades, a iniciativa, a capacidade de indignação; temporariamente vegeto, ainda que não tenha assumido aparência arbustiforme.


Ânimo, diria minha mãe se viva fosse. Sua voz ainda ecoa, suave, através dos anos, o semblante sereno, às vezes triste, mas sempre lindo. Tudo na vida resplandecia tranquilidade à sua presença, mesmo quando, vitimada por uma isquemia, andava com dificuldade, auxiliada por uma centenária bengala, que pertencera a Josué Carneiro de Lyra, um tio-bisavô, salvo engano.

Nostalgia. Resta grande a saudade de colo de mãe.

domingo, 1 de novembro de 2009

Finorinho

Abaixo, trecho do conto Finorinho, que faz parte de outro trabalho, que também está sendo concluído. Eita que vamos. Segue aí:


Arlindo não sabe precisar o exato momento em que desmoronou na frente de todos, na festa de aniversário do Martins. Sentiu que estava apagando, apagando, apagando e caiu como que um prédio no instante de sua implosão. Um desfalecer em slow motion, por assim dizer.

Foi um corre-corre danado. Os mais próximos cuidaram de acudi-lo; os mais distantes, instigados pela curiosidade, esticavam os pescoços. O que aconteceu? A versão majoritária era a de que, sendo um bebedor contumaz, o bruto embriagou-se tanto que deitou com os arreios.

Mas, na verdade, aconteceu que Arlindo, mais um casal de amigos que não via há muito, se postaram perto da churrasqueira, de costas para os outros convidados e, em absoluta discrição, aproveitando o vento favorável e a Lua em Júpiter, acenderam um baseado. De ótima procedência, por sinal, segundo se comentou.

Arlindo não se permitia a uma estultícia daquelas havia pelo menos uns bons vinte anos. Foram só uns peguinhas, mas o bastante para que a pressão arterial despencasse, levando consigo o corpo franzino para o chão.

Domingo

Aproveitei o domingão para ver os detalhes do acabamento da casa que erigimos. Concepção da Léa, que modéstia a parte, tem um talento inegualável. Está simplesmente espetacular. Tudo o que ela projeta vira arte.

Temos em comum o gosto por materiais que remetem às antigas sedes das fazendas paulistas e mineiras. Buscamos material de demolição e encontramos tijolos, portas, janelas, muita coisa.

O alicerce e boa parte das paredes levam tijolos que foram de casas de colônias da Fazenda Sant'Ana do Jardim, condomínio rural do qual somos sócios-proprietários. Portas, janelas, ladrilhos hidráulicos, fomos garimpando em uma e outra reforma ou demolição.

Creio que dentro de mais três semanas o Sobrado será nosso lar, nosso castelo, nosso ninho. Não vejo a hora.